quinta-feira, 18 de novembro de 2010

A filosofia e a complexidade

«Adquirimos conhecimentos espantosos sobre o mundo físico, biológico, psicológico, sociológico. A ciência impõe cada vez mais os métodos de verificação empírica e lógica. As luzes da razão parecem rejeitar nos antros do espírito mitos e trevas. E, no entanto, por toda a parte, o erro, a ignorância, a cegueira, progridem ao mesmo tempo que os nossos conhecimentos.

É-nos necessária uma tomada de consciência radical:

1. A causa profunda do erro não está no erro de facto (falsa percepção) ou no erro lógico (incoerência), mas no modo de organização do nosso saber em sistema de ideias (teorias, ideologias);

2. Existe uma nova ignorância ligada ao desenvolvimento da própria ciência;

3. Existe uma nova cegueira ligada ao uso degradado da razão;

4. As ameaças mais graves em que a Humanidade incorre estão ligadas ao progresso cego e descontrolado do conhecimento (armas termonucleares, manipulações de todas as espécies, desequilíbrio ecológico, etc.).

Eu pretendia mostrar que estes erros, ignorâncias, cegueiras, perigos têm um carácter comum que resulta de um modo mutilador de organização do conhecimento, incapaz de reconhecer e apreender a complexidade do real.»

Edgar Morin, "Mythes et realités", Colóquio Georges Orwell, Big Brother, un inconnu familier, 1984 in: Introdução ao Pensamento Complexo (Lisboa: Instituto Piaget, 5.ª ed., 2008)13-14.

1 comentário:

  1. Por acaso escrevi um texto há uns anos com o título "Lacunas da Evolução" com a mesma ideia.

    Acho que o problema do ser humano é que acha que (por ser recional) tudo o que faz está "correcto".

    A sociedade evolui, a passos largos, como disse Edgar Morin, em todas as ciências, quer físicas quer psicológicas. E já ninguém duvida da capacidade do homem de inventar, criar e evoluir.
    Associado a este conceito (falso) de evolução, a sociedade dá uma grande credibilidade à ciência porque partiu dos humanos. (Descobriram, inventaram ou criaram) Forma-se uma confiança tão grande entre a ciência e a sociedade que a própria (sociedade) começa a ter pensamentos dogmáticos: Tudo o que a ciência faz, está correcto.
    Ultimamente tenho notado cada vez mais, há um número crescente de "ateus", que confortáveis com a sua ciência absoluta, deixaram de tentar questionar a religião e interpreta-la, tomando a opinião da ciência - "é impossível/mentira" - e pior, deixaram de tentar questionar a própria ciência, formando-se assim uma espécie de religião ligada à ciência. (creio até haver já um nome para isso)
    Por isso a solução passa por evoluir, e sermos mais autónomos, não colocar todos os nossos ideais e valores/factos em que acreditamos num padrão pré definido por uma entidade externa. Quando evoluímos em todas as ciências, não estamos a evoluir, apenas a pensar que evoluímos, a verdadeira inteligência é saber aproveitar a nossa própria inteligência, saber o porquê de criar e termos responsabilidade pelo que criamos e saber saber e ter responsabilidade pelo que sabemos.

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