sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Lógica e Filosofia

«O pensamento consequente é o pensamento fundamentado. Um pensamento é consequente quando se baseia em razões e retira correctamente consequências das razões em que se baseia. (…)

A lógica permite determinar que consequências se retiram correctamente das nossas ideias e que consequências só aparentemente se retiram delas. Uma demonstração lógica é um modelo abstracto e simplificado do pensamento consequente (…).

Por exemplo, alguém poderá defender a seguinte ideia, hoje em dia muito popular: “Todas as verdades são relativas”. Sem formação lógica, acontece duas coisas a essa pessoa. Em primeiro lugar, não se apercebe que a sua ideia é auto-refutante – isto é, não se apercebe que a verdade da sua ideia implica a sua falsidade. Se todas as verdades são relativas, também esta é uma verdade relativa; mas ser uma verdade relativa significa que para algumas pessoas, ou em algumas circunstâncias, ou para algumas comunidades, esta ideia é falsa. Logo, se for verdade que todas as verdades são relativas, é falso em algumas circunstâncias que todas as verdades são relativas. Em segundo lugar, não só essa pessoa não se apercebe dessa dificuldade lógica elementar a que tem de responder, como sente que quem lhe apresenta este contra-argumento a está a enganar. Como o contra-argumento se baseia num raciocínio ligeiramente complexo e a pessoa em causa não tem instrumentos para avaliar a sua correcção, sente que está a ser enganada. O resultado dessa situação é que essa pessoa não está equipada para discutir ideias filosóficas – tudo o que consegue fazer é dar voz aos preconceitos do seu tempo, sem ter capacidade crítica para se distanciar das suas próprias ideias e procurar responder aos argumentos que se levantam contra elas. Nestas circunstâncias, o estudo da filosofia deixa de conduzir à liberdade do pensamento crítico e torna-se apenas um meio para sustentar preconceitos com nomes sonantes de filósofos e palavras complicadas.»

Desidério Murcho, O Lugar da Lógica na Filosofia (Plátano: Lisboa, 2003) 30-31.

2 comentários:

  1. Em primeiro lugar, uma das coisas que não gosto da filosofia, é partir do princípio que toda a gente pensa da mesma maneira, ou seja, "filosoficamente", racionalmente. Obviamente, quando uma pessoa diz "Todas as verdades são relativas" é óbvio, pelo senso comum que já está a admitir que aquela é a única verdade absoluta,que não é verdade, é um facto, os factos não podem ser verdadeiros ou falsos, logo quando uma pessoa afirma isso como o facto excluindo-o de ser julgado verdadeiro ou falso. Mas ninguém precisava que explicasse isto pois toda a gente já o tem subentendido, pelo bom senso. Desde sempre pensamos e obviamente vamos treinando e pensamento, o que estamos neste momento a fazer em filosofia é desmontar o pensamento que já nos é natural, e analisar peça por peça de onde vem o nosso "senso comum".
    Ora se a lógica faz parte do nosso pensamento, são as "peças" então significa que já que ela nos é natural é completamente inútil, a lógica está subentendida em tudo o que dizemos e não faz sentido vir tão cá atrás para contra argumentar alguma coisa. Quem contra argumenta com uma pessoa que não sabe estas regras claro que tem vantagem, ora, obrigado, eu também pouco posso contra argumentar contra alguém sobre Basebol já que não conheço os termos nem as regras do jogo. Logo, numa conversa normal, pode-se saltar esse passo, não há necessidade de definir a lógica já que ela está subentendida. Não digo que não seja importante, ela está sempre presente, por isso como não vai afectar as "contas", pode-se omitir.

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  2. Na verdade, quando uma pessoa diz que “Todas as verdades são relativas” não está a pensar que se está a contradizer, ou seja, a falta de conhecimentos filosóficos levam as pessoas a pensamentos muito menos verdadeiros e imparciais e a contradições sem o saber que o estão a fazer. Quanto a isso que o TJ disse sobre omitirmos certos passos, penso que é uma nova teoria, o facilitismo. As girafas só ficaram com o pescoço grande porque houve necessidade de procurarem comida em lugares onde outros animais não chegassem. Se optarmos pelo facilitismo não iremos desenvolver o pescoço e acabar por entrar num sociedade de néscios onde tudo o que for dito será bem aceite pois não é necessário contra argumentar. Os contra-argumentos só levam à melhoria dos pensadores e eleva o nível dos pensamentos: chama-se evoluir. Os dogmatismos merecem destaque pelo que representaram mas já estão fora de moda.
    Penso que existe uma ideia fixa nalgumas mentes que é um pouco errada: estamos a usar a filosofia sempre que pensamos. Penso que não é verdade pois se o for o estudo da filosofia é um hobby, pois já a usamos, não vale a pena estuda-la. Só se admitirmos que a lógica e a filosofia estão sempre presentes, mas para assinalar o quão corrupto é o nosso pensamento. A nossa mente é como um pára-quedas, só funciona aberto, e a filosofia ajuda a abrir a mente e nem todos têm o privilégio de ter um pensamento imparcial, racional e logicamente correcto.

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